O eterno vira-lata brasileiro viaja para fora e se deslumbra. Ah, que incrível a arte de rua de Londres! Impressionantes as ruas movimentadas de Tóquio! Delícia os parques cheios de Berlim! Não é estranho que a gente fique tão deslumbrado quando vamos para fora do país e vemos como as ruas são usadas pelos locais, e de volta à casa, vivamos dentro dos nossos muros, janelas de carros e portas, que fecham tudo o que acontece de bacana dentro de quatro paredes, longe dos olhos dos passantes?
O Carnaval, a maior festa popular de rua do mundo, acabou de passar e o deste ano foi um marco para São Paulo. Nunca na história tantas pessoas correram para as ruas para festejar com os blocos, lotando avenidas e bairros com música e diversão. Isso é a consequência de um movimento que, finalmente, vem tomando corpo e crescendo cada vez mais na cidade, mudando a forma como a população a enxerga e usa. Nos últimos anos, alguns grupos começaram a romper as barreiras do privado à força e tomar conta dos espaços públicos para promover feiras, festas, atividades esportivas e de lazer. Hoje, lugares antes relegados a passantes, camelôs e mendigos, viraram pontos de encontro importantes e é impensável um fim de semana em que não aconteça pelo menos um evento grande ao ar livre e muitas das vezes aberto ao público.
E assim descobrimos novamente o poder da rua. Através do entretenimento, tomamos o espaço público de assalto. E agora queremos mais. Não basta usar, tem também que cuidar. Queremos festa no parque, mas o parque tem que estar limpo e bem cuidado. Vamos a um show na praça e chegamos a ela de forma segura pela ciclovia. E também queremos mais verde, menos carros, mais segurança, menos opressão. O engajamento público é o sinal mais claro que, isolados, população e governo não vão a lugar nenhum. A prefeitura não tem condições de atuar em todas as frentes de forma eficiente e a população cansou de esperar e tomou as rédeas.

Um caso fantástico e heróico, é o do Hélio da Silva. Sozinho, ele plantou mais de 17.800 árvores do Parque Tiquatira, na Zona Leste, às margens degradadas do rio com o mesmo nome. Nem precisa dizer qual foi o enorme impacto que sua ação causou na região. Da mesma forma, pessoas e grupos estão causando grandes mudanças no paradigma da cidade. É o caso do SP Invisível, movimento de conscientização sobre a população de rua; do Vídeo Guerrilha, que estimula a produção artística sobreposta à arquitetura e ao espaço público das cidades; do Cidade Ativa, que fomenta a discussão sobre o impacto que o planejamento urbano e a arquitetura das edificações exercem sobre estilos de vida e sobre saúde pública; o Dá Pé, um projeto de reflorestamento via crowdfunding; e os grupos dos projetos Mil Orquídeas Marginais, Acupuntura Urbana e A Batata Precisa de Você, que organizam eventos de reestruturação e ressignificação de espaços públicos de São Paulo.
Todas essas entidades e pessoas, entre outras tantas, estarão no Festival Path, em palestras e conversas, para apresentar seus trabalhos e propor novas reflexões. É uma ótima oportunidade para todos nós podermos entender melhor o papel da movimentação popular em prol da coletividade, permitindo a cada cidadão refletir sobre o papel a assumir na transformação da nossa cidade. Eu, com certeza, não vou perder.
O Festival Path acontece nos próximos dias 14 e 15 de maio e vai tomar conta das ruas de Pinheiros em São Paulo, com muita música, filmes, palestras, feiras gastronômicas e arte. Vamos?
Foto do destaque: Projeto Centro Aberto da PMSP – Largo do Paissandu – fonte: reurb.blogspot.com.br
