A gente estuda um pouco o que é obrigatório conhecer. Mas gostamos de flanar pelos lugares, sair do circuitão, viver a vida dos locais. Sem pressa. Temos um cronograma, que dá um esqueleto para a viagem, mas sempre deixamos bastante espaço para o improviso – e para nos encantarmos com o inusitado. A Lu é especialista em achar lugares muito charmosos para ficarmos e para comermos. Engordo bastante nas viagens…
De nada. Vou aberto a viver a experiência como ela se apresentar. Quando viajamos a dois, é uma viagem de um casal adulto, já adentrando a meia idade. Quando viajamos a quatro, com as crianças, é uma viagem para os kids. Como eles já estão quase pré adolescentes, e eu ainda não consegui deixar de ser um adolescente, a gente está começando a coincidir mais os interesses. Talvez eu evite apenas os lugares de compras, os lugares clichês, as opções óbvias demais, desenhadas para turistas. E jamais subo num ônibus de excursão ou tiro fotos que me impeçam de ver só para depois mostrar aos outros – ou postar no Instagram.
Na mala tem a vida ou só o necessário? O que não pode faltar nela?
Sou econômico na hora de fazer as malas. Prezo roupas confortáveis e ponto. Sempre deixo um espaço para as camisetas que inevitavelmente compro pelo caminho – sou um T-Shirt freak. Tá bom, confesso, sou meio doido por tênis também.
Qual é a melhor casa fora de casa?
Um quarto limpo e acolhedor, com um banheiro bacana. Você não pode de modo algum desconfiar do seu banheiro! E um bom prato de comida local, talvez com uma taça de vinho do lado. Pronto. O resto é comigo. Agora, tão bom quanto viajar é voltar para casa. Às vezes parece que a graça de sair só se completa com a volta. There is nothing like home!
5 lugares/coisas imperdíveis nesta vida?
Acho que viver a experiência genuína, onde ela estiver. Viajar é sair de si. Pode ser um vento quente à noite em Fernando de Noronha. Uma tarde vendo badulaques num shotengai (vielas comerciais) de Kyoto – adoro Kitaoji Dori. Sentar pela terceira ou quarta vez diante de um quadro do Pollock no Metropolitan, em Nova York – e enxergar coisas novas. Tomar uma pilsen em Pilsen!
Melhor experiência gastronômica do mundo?
A gente fez uma extravagância em Paris, quando a Lu estudava gastronomia – comemos em cinco restaurantes estrelados pelo guia Michelin numa mesma semana, de segunda a sexta. Guy Savoy, Pierre Gagnaire, Ledoyen, Le Pré Catalan e Alain Ducasse. Tou pagando a conta até hoje! A Lu escreveu sobre nossa jornada aqui. Difícil de bater essa, né? Não na mesma vida, pelo menos. Não com o mesmo cartão de crédito.
Melhor drink/ bar/ festa?
O melhor drink é o Ramune – um refrigerante de limão japonês que vem numa garrafinha toda especial: você abre a tampa e uma bola de vidro cai para dentro da garrafa, gerando uma experiência única para quem bebe. Como sou um viajante diurno, uso a noite mais para dormir mesmo. Quando há uma réstia de energia, fazemos a festa dentro do quarto, a dois, antes de adernarmos. Há tempos que não saio para a balada – muito menos em viagem. No entanto, para este não ser um item sem graça da entrevista, confesso que temos o dom de encontrar celebridades pelos lugares. Uma vez, num restaurante tailandês em Londres, hypadíssimo, estávamos na fila do táxi depois do jantar – que em Londres é uma Mercedes dirigida por um africano ou por um hindu – e, quando eu olho para trás, estava um cara alto, com cabelo encaracolado, bem ajeitado com gel, e lábios carnudos – era o Lionel Ritchie, escudado por um loura descomunal. Ou duas, não lembro – é que só tenho olhos para minha mulher.
O que você sempre compra que só acha lá?
Adoro camisetas e tênis que sejam smart e exclusivos. Adoro livros. De resto, sou mais um “window shopper”, um voyeur, do que propriamente alguém que compra muito em viagens. Mas curto lojinhas especiais, daquelas que você só encontra em becos. Certa vez, em Harajuku, o bairro trendy de Tokyo, que lança os estilos de street wear com anos de dianteira em relação ao resto do mundo, um japa me abordou – coisa raríssima de um japonês fazer. Eu estava com uma camiseta do Green Day. Subi as escadas de uma galeria e fui conhecer a loja do cara. Era um salinha de 15 metros quadrados com duas araras cheias de roupas bacanas. Na parede, fotos do Green Day com ele, na loja dele. Uma dez fotos. Cada uma de um ano. Sempre que a banda fazia shows em Tokyo, passava por ali, naquele cubículo, para abastecer o guardarroupa.
Maior vanessismo?
O maior perrengue que passei foi em Los Angeles. Estávamos de carro, indo do nosso hotel para a casa de um amigo que morava lá na época. Saí da highway no ponto errado. Caímos num bairro meio barra pesada. Ao manobrar o carro, para voltar à highway, dei um totozinho num carro que estava estacionado. Tipo: só encostei o parachoque mesmo. Mas saíram de dentro do carro dois manos latinos, dois gangsta, com lenço amarrado na cabeça, calça larga e baixa, tatuagem ostensiva, o pacote completo do badass mothafucka. Um dos caras me olhou, disse que eu tinha amassado o carro do amigo dele e que eu teria que pagar por isso. Disse, no pior inglês que pude forjar, que éramos brasileiros, que minha mulher estava grávida (ela só engravidaria no ano seguinte…), que estávamos voltando ao Brasil naquela noite, que eu já tinha trocado o dinheiro e que tudo que tinha comigo eram 20 dólares. Lu, que acompanhava tensa a conversa no banco do passageiro, me alcançou a nota correspondente, eu entreguei ao sujeito e arranquei antes que ele pudesse contra-argumentar.
Se for para relaxar, qual é o melhor lugar?
Eu geralmente viajo com fome do lugar para onde estou indo – então relaxo pouco. Quero ver, falar, beber, comer, caminhar, respirar, aprender e apreender. Acho viajar e relaxar ações meio incompatíveis. Talvez o melhor lugar para relaxar seja Itu, à frente da piscina, com um livro numa mão e uma cerveja na outra. Viagem é expedição. Viagem é aventura.
E para ficar a dois?
Minha ideia de aconchego é uma cabana com lareira num lugar com neve, longe de tudo, perto do mato, num sopé de montanha – em que você mal precise abrir a porta da frente. Ushuaia, aqui pertinho, oferece isso, a um custo (ainda) bom.
E se estiver sozinho e quiser badalar?
Uau. Nessa hipótese, infelizmente remota para mim, eu ligaria para a Lalai e perguntaria – “e aí, Lalai, qual é a boa?”
Se fosse largar tudo e se mandar de vez, iria para onde?
São Paulo tem me ajudado a fantasiar com isso com cada vez mais frequência. Sonho com uma cabana. Para escrever. Num cenário de verão, perto dum mar quente como o do Nordeste brasileiro. Num cenário de inverno, algo como aquela montanha nevada que relatei ali em cima.
Destino desejo ainda não realizado?
Já citei alguns. Há outros. Escandinávia – para entender a diferença entre Suécia, Dinamarca, Noruega e Finlândia. (Adoro quando os suecos falam como se os noruegueses fossem ricos – e eles, os suecos, não. ) A Grécia e o Egito históricos. As grandes praias, da Malásia ao Caribe, passando pela própria Grécia. E há lugares que eu talvez jamais visite: Índia, a África Central, o mundo árabe/persa (conheci Dubai e Abu Dhabi, está ótimo), a América Latina e o Sudeste Asiático – os países que eu já conheço nessas regiões já me matam com sobras a curiosidade.

